Crimes Sexuais em Guerras: Quando o Corpo Vira Campo de Batalha

Quando o corpo vira campo de batalha, é no direito e na escuta que a dignidade precisa renascer

Quando se fala em guerra, o imaginário coletivo evoca tiros, bombas, tanques. Mas há um outro campo de batalha, tão silencioso quanto devastador: os corpos violentados, as sexualidades invadidas, as identidades destruídas.

A violência sexual em conflitos armados não é “efeito colateral”. É uma arma de guerra estratégica, cruel e calculada — usada para dominar, punir, humilhar e desestruturar sociedades inteiras.

Estupro Como Arma de Guerra: Uma Estratégia Milenar

Desde a Antiguidade, exércitos invasores saqueiam, matam… e estupram. A prática é antiga, mas só recentemente passou a ser reconhecida juridicamente como crime de guerra e crime contra a humanidade.

Esses crimes não são cometidos por “soldados descontrolados”. Muitas vezes são ordenados, incentivados ou tolerados pelas autoridades militares como forma de:

  • Aterrorizar populações e forçar o êxodo;
  • Punir o inimigo, violando o que ele tem de mais íntimo;
  • Eliminar linhagens, por meio de gravidez forçada e “limpeza étnica”;
  • Desestabilizar culturas, especialmente as que associam honra à virgindade ou à pureza da mulher.

Mas Não São Só Mulheres: O Silêncio das Outras Vítimas

Embora a maioria das vítimas identificadas em guerras sejam mulheres e meninas, homens, meninos e pessoas LGBTQIA+ também são violentadas sexualmente — e quase sempre silenciadas.

Crianças

  • São alvos fáceis em guerras civis, conflitos tribais e invasões armadas.
  • Sofrem estupros, escravização sexual, mutilação genital e uso como “esposas de guerra”.
  • Muitas vezes são recrutadas como soldados e estupradas repetidamente.

Homens

  • Sofrem estupro anal, emasculação, forçamento de atos sexuais entre si, tudo como forma de humilhação e destruição da identidade masculina.
  • Em algumas culturas, ser vítima de estupro é mais estigmatizante do que a morte.
  • O trauma é ampliado pelo silêncio social, jurídico e até médico.

Pessoas LGBTQIA+

  • São perseguidas e torturadas em regimes autoritários, guerras religiosas ou conflitos étnicos.
  • A violência sexual contra elas costuma ser associada à “correção moral” ou à extinção da identidade “indesejada”.

Casos Históricos e Atualidade

  • Bósnia (1992-1995): Mulheres muçulmanas estupradas em massa. Homens também foram violentados em prisões.
  • Ruanda (1994): Estupros em larga escala, muitos resultando em contaminação por HIV.
  • Síria, Congo, Sudão, Ucrânia: Diversos relatos de estupros de homens, mulheres e crianças por soldados e milícias.
  • Colômbia: Guerrilhas e paramilitares cometeram estupros sistemáticos durante décadas.
  • Brasil (território indígena Yanomami, prisões, comunidades militarizadas): relatos que, embora não em cenário de guerra formal, refletem dinâmicas de ocupação violenta semelhantes.

A Lógica da Violência Sexual em Guerras

Por que esses crimes ocorrem?

  1. Dominação Total – O estupro é o ato simbólico de controle absoluto.
  2. Desumanização – O inimigo vira objeto, e seu corpo um troféu ou alvo.
  3. Desestruturação Social – Ao destruir o corpo da vítima, destrói-se a família, a comunidade, a identidade coletiva.
  4. Permissividade Estatal ou Militar – Em guerra, há colapso da ética, do direito e da empatia. A impunidade se instala.
  5. Patriarcado Armado – A guerra é o ápice da masculinidade tóxica institucionalizada. Masculinidade, honra e força confundem-se com brutalidade e posse.

O Direito Internacional e a Luta por Reconhecimento

  • Estatuto de Roma (2002): reconhece estupro, escravidão sexual, gravidez forçada e mutilações como crimes contra a humanidade e crimes de guerra.
  • Tribunais internacionais puniram líderes em Ruanda, Bósnia e Congo.
  • Mas ainda há subnotificação, silêncio institucional e ausência de políticas de reparação adequadas, sobretudo para homens e pessoas LGBTQIA+.

E No Brasil?

Vivemos uma guerra não declarada. Militarização de territórios, violência policial, racismo estrutural, sistema prisional brutalizado. Aqui também há violência sexual institucional:

  • Estupros nas prisões (muitas vezes entre homens, usados como castigo ou dominação);
  • Violência sexual contra adolescentes em abrigos e internações;
  • Estupro de mulheres em territórios ocupados (como indígenas ou favelas).

Advocacia Criminal: Escutar, Proteger e Denunciar

Na Prudente Advocacia Criminal, compreendemos que o papel da advocacia vai além da técnica: ele envolve escuta empática, atuação firme e compromisso com os direitos humanos.

Nosso trabalho, frente a crimes sexuais, exige:

  • Conhecimento técnico e sensibilidade humana;
  • Respeito ao sigilo, à dor e à subjetividade da vítima;
  • Combate às estruturas que normalizam a violência e silenciam quem sofre.

Conclusão: O Corpo Não É Campo de Batalha

Seja em guerras armadas, em prisões, nas ruas ou nas casas, o corpo é o primeiro território que precisa ser respeitado.

A justiça começa quando reconhecemos o que por muito tempo foi invisível.
Quando escutamos o que foi silenciado.
E quando atuamos para transformar dor em dignidade.

O corpo não é trincheira. O corpo é morada. E merece proteção.

Essa reflexão se conecta aos artigos O sangue que me trouxe até aqui: uma homenagem aos povos originários, sobre a violência sexual contra povos originários, e O Estupro de homens: a outra face da violência sexual no Brasil, que denuncia a face silenciada da violência sexual masculina no Brasil. Juntos, reafirmam nosso compromisso com uma advocacia que escuta, acolhe e transforma.

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Se você estiver enfrentando uma situação semelhante ou deseja saber mais sobre o tema, consulte um advogado especializado para entender melhor seus direitos e obrigações.

O Escritório Prudente Advocacia está pronto para te ajudar. Entre em contato conosco pelo telefone (WhatsApp): (44) – 99712-5932 ou pelo E-mail: contato@prudentecriminal.adv.br.

Neemias Moretti PrudenteAdvogado Criminalista. Mestre e Especialista em Ciências Criminais. Bacharel em Direito e Licenciado em Filosofia. Escritor, Terapeuta e Professor. Bibliófilo e Cinéfilo. Colunista: Escrever para Não Enlouquecer

Publicado por Factótum Cultural

Um amante do conhecimento, explorador inquieto e ousado, que compartilha ideias e expande consciências pelo vasto universo.