Absolvição em Caso de Estupro de Vulnerável: STJ Anula Condenação por Fragilidade Probatória

Em decisão proferida em 17 de fevereiro de 2025, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) absolveu J. do N. da C., condenado anteriormente a 15 anos de prisão por estupro de vulnerável, em um processo oriundo do Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR). Relatado pelo Ministro Og Fernandes, o habeas corpus (HC nº 830612 – RR) revelou falhas graves no conjunto de provas que sustentavam a acusação, resultando na anulação do acórdão da revisão criminal e na absolvição do réu.

O caso teve início com a denúncia do acusado pelo crime previsto no artigo 217-A do Código Penal, que pune o estupro de vulnerável, combinado com o artigo 226, II, devido a supostos atos libidinosos contra sua filha, então com 3 anos. A sentença original baseada em dois pilares: o depoimento da mãe da criança e um relatório psicológico extrajudicial, que descrevia abusos narrados pela vítima em atendimento no CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social). No entanto, a defesa apresentou elementos que desmontaram essa fundamentação.

Em 2022, a genitora retratou-se formalmente em escritura pública, admitindo que as acusações contra o pai da criança eram falsas, motivadas por vingança após o fim do relacionamento. Além disso, a própria vítima, ao depor em audiência especial, negou qualquer abuso, afirmando não se lembrar de incidentes na casa do pai e rejeitando as acusações atribuídas a ele. O relatório psicológico, por sua vez, não foi confirmado em juízo, defendendo ainda mais a tese absolutória.

A “Síndrome do Segredo” e seus Limites

Na sentença inicial, a negativa da vítima em justiça foi interpretada à luz da chamada “síndrome do segredo”. Esse conceito, amplamente discutido na psicologia forense, refere-se a um comportamento comum em crianças vítimas de violência sexual, especialmente em contextos intrafamiliares. Por medo, vergonha ou pressão emocional, elas tendem a ocultar ou negar os abusos em situações formais, como depoimentos judiciais, mesmo tendo relatado os fatos em ambientes mais acolhedores, como terapias ou conversas com familiares. No caso em questão, a magistrada de primeira instância usou essa teoria para fundamentar a fundamentação, considerando que a negativa da criança em juízo não invalidava os relatos anteriores.

Contudo, o STJ entendeu que a aplicação da “síndrome do segredo” não pode ser automática ou suficiente para sustentar uma condenação, sobretudo quando outros elementos de prova são frágeis ou contraditórios. O Ministro Og Fernandes destacou que, sem corroboração judicial do relatório psicológico e com a representação da testemunha principal (a mãe), a presunção de culpa não se sustentava. A “síndrome do segredo”, válida em muitos contextos, exige suporte probatório robusto para não se transformar em mera especulação, especialmente em um processo penal que exige certeza além da dúvida razoável.

Decisão do STJ e Reflexões

O Ministério Público Federal, ao que parece, também concluiu a insuficiência das provas e defendeu a absolvição. Para o relator, a “ilegalidade flagrante” do caso superou a regra de que o habeas corpus não substitui recursos próprios, levando à concessão da ordem. A decisão anulou o acórdão de revisão criminal e absolveu o acusado, reforçando que condenações por crimes graves, como o estupro de vulnerável, exigiram um arcabouço probatório sólido e inequívoco.

Esse precedente do STJ sublinha a necessidade de equilíbrio na análise de provas em casos sensíveis, evitando que interpretações precipitadas ou vinganças pessoais resultem em injustiças. A “síndrome do segredo”, embora seja uma ferramenta importante para compreender o comportamento das vítimas, não pode substituir evidências concretas, sob pena de comprometer o direito fundamental à presunção de inocência.

Veja a decisão do STJ, na íntegra:

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Publicado por Factótum Cultural

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