Violência, Segurança e Justiça: O Que o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2025 Revela Sobre o Brasil

Em meio às transformações sociais, políticas e tecnológicas que vivemos, os dados do 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2025) revelam não apenas números, mas rostos, corpos e silêncios que precisam ser ouvidos — sobretudo por quem atua no Sistema de Justiça.

Entre 2023 e 2024, o Brasil registrou 44.127 Mortes Violentas Intencionais (MVI), com uma taxa de 20,8 mortes por 100 mil habitantes. Ainda que haja uma queda progressiva da violência letal nos últimos anos, os dados mostram que a violência muda de forma, mas não desaparece.

📌 Perfil das vítimas: a face da desigualdade

Os números mostram uma realidade que nós, que atuamos nas trincheiras da justiça criminal, já conhecemos:

  • 91,1% das vítimas de MVI são homens
  • 79% são negros
  • 48,5% têm até 29 anos
  • 73,8% mortos com arma de fogo
  • 57,6% em via pública

Trata-se, portanto, de uma violência racializada, juvenil e socialmente marginalizada. Como advogado criminalista, não posso ignorar o impacto estrutural do racismo, da pobreza e da ausência do Estado — tanto na prevenção quanto na garantia de direitos.

👮‍♂️ Letalidade policial e o paradoxo da segurança

O Anuário revela que algumas cidades brasileiras têm mais de 50% de suas mortes causadas por policiais, com destaque para capitais do Norte e Nordeste. Em 2024, a letalidade provocada pelas polícias foi de 2,9 por 100 mil habitantes — o que acende um alerta: quem protege a população também está matando parte dela.

Em paralelo, os dados também revelam uma tragédia silenciosa: policiais civis e militares morrem mais por suicídio do que por homicídio em serviço ou na folga. Esse dado reforça a necessidade urgente de discutir saúde mental dentro das corporações, sem tabus e com responsabilidade.

👧🏽 Crianças, adolescentes e o futuro ameaçado

O crescimento dos crimes contra crianças e adolescentes é alarmante:

  • Em 2024, 2.356 crianças e adolescentes foram vítimas de mortes violentas intencionais no Brasil, número que representa uma alta de 3,7% em relação ao ano anterior.
  • Aumento expressivo de maus-tratos, abandono e violência sexual infantil
  • 245% de crescimento nas interrupções escolares por violência entre 2021 e 2023

Além disso:

  • 2.543 registros criminais de bullying
  • 452 registros de cyberbullying

Como operador do Direito, é fundamental exigir políticas públicas voltadas à proteção integral de crianças e adolescentes, conforme determina o ECA e os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. A omissão diante desses dados é uma forma de violência institucional.

🚫 Violência de Gênero e Feminicídios: a dor que o sistema insiste em silenciar

O Brasil registrou, em 2024, o maior número de estupros e estupros de vulnerável da história: foram 87.545 vítimas, sendo 76,8% delas pessoas vulneráveis, 87,7% do sexo feminino e 55,6% negras. O feminicídio segue como expressão máxima dessa violência: 1.492 mulheres foram assassinadas por sua condição de gênero, sendo 63,6% negras e 70,5% com idade entre 18 e 44 anos. A cada 10 vítimas, 8 foram mortas por companheiros ou ex-companheiros; 64,3% dos crimes ocorreram dentro de casa. Em outras palavras, o que deveria ser espaço de afeto e proteção, continua sendo o local mais perigoso para milhares de brasileiras.

Mesmo diante da gravidade, o Estado segue falhando em proteger. Em 2024, foram concedidas mais de 1 milhão de Medidas Protetivas de Urgência (MPU), mas 10,8% foram descumpridas pelos agressores — ou seja, mais de 100 mil violações da ordem judicial. A Lei Maria da Penha é uma conquista, mas sua aplicação segue fragilizada por falta de estrutura, fiscalização e responsabilização eficaz.

Como advogados, precisamos ir além da defesa técnica: é nosso dever cobrar do Judiciário rigor na aplicação das medidas protetivas e responsabilização dos verdadeiros agressores. Mas também é preciso atenção ao aumento das acusações falsas, que, embora minoritárias, geram danos irreparáveis. A luta contra a violência de gênero exige justiça — não vingança nem parcialidade. É preciso proteger quem sofre, sem punir inocentes.

📉 Prisões, drogas e reincidência: um ciclo vicioso

O sistema prisional brasileiro já ultrapassa os 900 mil presos, com 94% de homens e 68,7% de negros – mantendo o padrão de seletividade penal. A reincidência permanece elevada e a inserção produtiva é mínima: apenas 20% dos presos trabalham.

Há um um déficit de 237.694 vagas. Ou seja: há quase um quarto de milhão de pessoas encarceradas sem espaço legal no sistema.

Em busca de soluções alternativas, o Estado ampliou o uso da prisão domiciliar com monitoramento eletrônico, que já alcança 13,5% da população encarcerada.

Enquanto isso, o tráfico de drogas segue em expansão — com aumento nas apreensões de maconha (+21,5%) e cocaína (+10,1%) entre 2023 e 2024.

A pergunta que se impõe: estamos punindo ou apenas armazenando corpos negros e pobres sob o pretexto de justiça?

Segurança custa caro: entre o público em crise e o privado em expansão

A despesa total com segurança pública no Brasil chegou a R$ 153 bilhões em 2024, somando União, Estados e Municípios — um aumento de 6,1% em relação ao ano anterior.

Apesar do aumento de recursos, os efeitos sobre a redução da violência ainda são desiguais e questionáveis. Ao mesmo tempo, o mercado de segurança privada vive um aquecimento visível: são mais de 571 mil vigilantes ativos no país, com crescimento de 7% nos postos de trabalho formais apenas em 2025.

A nova Lei nº 14.967/2024 reforçou a fiscalização contra profissionais clandestinos, mas também consolidou esse setor como um braço paralelo (e caro) da segurança pública, muitas vezes acessível apenas às camadas mais privilegiadas da população.

Em outras palavras, enquanto o Estado gasta mais e oferece menos, o cidadão que pode paga por sua própria proteção — acentuando desigualdades e fragilizando a noção de segurança como direito universal.

🔍 Conclusão: e o papel da advocacia criminal?

O Anuário é um espelho doloroso do Brasil. Mas não basta olhar — é preciso agir. A advocacia criminal tem um papel essencial não apenas na defesa técnica, mas na preservação dos direitos humanos, no enfrentamento ao racismo estrutural e na luta por um sistema de justiça mais justo, humano e eficaz.

Nosso trabalho deve ser combativo, mas também propositivo. Precisamos fazer com que os números ganhem voz, e que as vítimas — inclusive do sistema — sejam reconhecidas como sujeitos de direitos.


Se você atua na área jurídica, é estudante ou cidadão interessado em justiça, recomendo a leitura integral do Anuário. Acesse gratuitamente em: https://forumseguranca.org.br


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Neemias Moretti PrudenteAdvogado Criminalista. Mestre e Especialista em Ciências Criminais. Bacharel em Direito e Licenciado em Filosofia. Escritor, Terapeuta e Professor. Bibliófilo e Cinéfilo. Editor-Chefe do Factótum Cultural. Colunista dos blogs: Tertúlia Criminal e Escrever para Não Enlouquecer.

Publicado por Factótum Cultural

Um amante do conhecimento, explorador inquieto e ousado, que compartilha ideias e expande consciências pelo vasto universo.